sábado, 21 de janeiro de 2023

Crítica ao Fascismo Eterno de Umberto Eco

 


A argumentação inicial de Eco é que o fascismo é um movimento eclético e pouco consistente, com contradições evidentes ao longo de seu desenvolvimento; que o impossibilitam de criar uma ideologia concreta e por isso ele é, na verdade, várias características, ações e reações humanas que se expressam de maneiras heterogêneas nas diferentes sociedades, daí surge o conceito "fascismo eterno".  Porém Eco não conhece o processo de construção das ideologias porque escreve sobre política - que não é sua área de estudo - sobre preconceitos de seu próprio pensamento, se não saberia que assim como toda ideologia em seus primordios nada não passa de um idealismo, que ao colocado na prática se "atualizará" uma hora outra de acordo com o contexto momentâneo para atingir determinados fins. 

E assim como o marxismo e liberalismo, o fascismo igualmente tem influências distintas e isso é perfeitamente normal. O liberalismo pega sua base dos nominalistas, seu contratualismo da escola de Salamanca, seu racionalismo de Voltaire, sua teoria economia de Adam Smith, seu indivíduo de Descartes e vários outros autores que podem ser considerados contraditórios entre si em análise minuciosa. O marxismo pega suas ideias de dialética de Hegel, sua luta de classes de Saint Simón, sua política econômica tem forte influência igualmente de Smith e David Ricardo, seu materialismo de Ludwig Andreas e suas ideias de igualdade são revisões do pensamento iluminista com notório exacerbamento de tal.

Segundamente, uma característica retirada de um sistema ideológico-doutrinário deixa de ser a própria ideologia. 

A luta de classes retirada do conjunto sistemático de ideias do marxismo deixa de ser marxismo e pode facilmente ser cooptada por outra ideologia política. O livre-comercio retirado do conjunto de ideias do liberalismo deixa igualmente de ser liberalismo. Assim como o conjunto de características citadas por Eco, retiradas do contexto do fascismo deixará inevitávelmente de ser fascismo. 

Exemplo: a URSS, A China moderna, A Kampuchea e vários experiências socialistas e líderes de países ocidentais notoriamente liberais podem ser considerados possuídores de tais características citadas por Eco, conscientemente.

Sendo assim, eles são fascistas? Não, simples. Estás características são tão abrangentes que podem abarcar desde de uma experiência comunista ao idoso que não gosta de tecnologia. 

 Nós também podemos discutir qual a viabilidade dessas características compartilhadas por Eco, por exemplo:

O fascismo nunca foi "tradicionalista" em sua origem, ele usava mitos para mobilizar às massas e criar uma memória para legitimação do regime. E sua afeição aos mitos se dá pela sua exaltação a idéias renascentistas e seu nacionalismo, que não custa relembrar, que é uma idéia da revolução francesa. O fascismo buscava recursos justamente para potencializar suas forças produtivas para tomar os rumos da modernidade. Nunca negando o pensamento basilar das ideias modernas como a própria idéia de progresso, da ciência moderna, do indivíduo, pelo contrário, queria impor sua própria interpretação de tais ideias. 

Fica evidente que Eco tenta extender essas determinadas características de um fascismo a todas às experiências fascistas, o que é totalmente inviável pela diversidade de fascismos.

Podemos inclusive discutir se tais características citadas são verdadeiramente inertes do "fascismo".

Pode-se argumentar que boa parte do fascismo no terceiro mundo não possuía boa parte das características citadas por Eco, como o integralismo brasileiro e o sinarquismo mexicano.

E o mais importante, não há fascismo em potência em nada atualmente. O Fascismo Eterno é um mito, o fascismo está morto, pelo simples fato que para uma ideologia existir concretamente é necessário um projeto de expansão ideológico, que não há no fascismo desde de sua queda em 1945. 

Essas características fora de contexto não são fascismo, como já supracitado. 

Sendo assim, o que é fascismo?

Para se dar uma definição de fascismo verdadeira e objetiva deve se analisar o que verdadeiramente estava sendo "exportado" para o mundo quando ele já estava verdadeiramente e minimamente consolidado como ideologia - no ventennio - ignorando revezes históricos do fascismo italiano que são um desenvolvimento do fascismo atrelado exclusivamente a um momento histórico específico e não um fim da ideologia em si, como a RSI. 

Para isso é necessário desvincular o fascismo da Itália e vê-lo como ideologia adaptável a cada realidade nacional e com fins heterogêneos de acordo com às nações que o adotaram.

Sendo assim, pode-se definir o fascismo como: um movimento anti-comunista, anti-liberal, corporativista e nacionalista, com um forte viés expansionista.

Seu anti-comunismo militante é diferente do comunismo anti-liberal porque não se dá pela opressão do indivíduo pela classe ou estado, mas pela negação da nação.

Seu anti-liberalismo é diferente dos comunistas porque não é criticado pela opressão de uma classe sobre a outra, mas pela incapacidade do liberalismo de organizar a nação.

Seu corporativismo não é o medieval que dava certa autonomia às corporações para se auto-organizarem, mas um que subjulga os interesses das classes em prol dos interesses do estado.

Seu nacionalismo é o "assimilador" , reciclado das experiências do século XIX, que busca criar uma identidade nacional monolítica para os povos que habitam tal país em prol de uma unidade.

Seu expansionismo não é apenas por meios militares e não busca simplesmente fins econômicos, mas acima de tudo expressar a vontade de tal povo de se transmitir como grandioso internacionalmente.

Para nós do Centro de Estudos Minayba essa é a definição nua e crua de fascismo. 

O mito da luta antifascista que teve seu ápice na grande guerras das ideologias em 1939-1945, permitiu a existência de um vácuo mobilizacional com a derrota total do fascismo, setores das sociedades ocidentais que se legitimavam por essa luta cooptaram a teoria de Eco para continuarem existindo como força ativa contra os milhões de fascistas inexistentes.

Tal argumentação de Eco é usada atualmente como bode expiatório contra qualquer projeto minimamente conservador-popular e para blindar movimentos duvidosos de críticas.

"Para poder se proteger, a burguesia inventará um antifascismo contra um fascismo que não existe mais."

~ Pier Paolo Pasolini




sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

Caim e Abel - René Guénon

 

A «solidificação» do mundo tem ainda, na ordem humana e social, outras consequências de que não falamos até agora: a este respeito, ela cria um estado de coisas no qual tudo está contado, registado e regulamentado, o que, no fundo, não é mais do que outro género de «mecaniza­ção»; nada é mais fácil do que constatar por todo o lado, na nossa época, factos sintomáticos tais como, por exemplo, a mania dos recenseamentos (que se liga, aliás, directamente à importância atribuída às estatísticas) , e igualmente, a mul­tiplicação incessante das intervenções administrativas em todas as circunstâncias da vida, intervenções que devem ter como efeito certamente assegurar uma uniformidade tão completa quanto possível entre os indivíduos, tanto mais que, de certo modo, é «princípio» de qualquer administração moderna tratar esses indivíduos como simples unidades numéricas todas semelhantes entre si, isto é, agir como se, por hipótese, a uniformidade «ideal» estivesse já realizada, obrigando deste modo todos os homens a ajustarem-se, se assim de pode dizer, a uma mesma me­ dida «média». Por outro lado, esta regulamentação cada vez mais excessiva tem uma consequência bastante paradoxal: é que, quanto mais se glorifica a rapidez e a facilidade crescentes da comunicação entre os países mesmo os mais afastados, graças às invenções da indústria moderna, põem-se ao mesmo tempo todos os entraves possíveis à liberdade dessa comunicação, de tal modo que é muitas vezes praticamente impossível passar de um país para outro, ou pelo menos, tornou-se mais difícil do que nos tempos em que não havia nenhum meio mecânico de transporte. É mais um aspecto particular da «solidificação»: num mundo assim, já não há lugar para os povos nómadas que até agora têm subsistido em condi­ções diversas, porque cada vez menos encontram espaço livre diante de si. Aliás, todos se esforçam por todos os meios para os levar à vida sedentária, de modo que, também sob este aspecto, não parece longe o momento em que «a roda dei­xará de andar; além disso, nesta vida sedentária, as cidades, que representam, de certo modo, o último grau da «fixação», tomam uma preponderância impor­tante e tendem cada vez mais a absorver tudo; e é assim que, perto do final do ciclo, Caim acabara realmente por matar Abel.

Com efeito, no simbolismo bíblico, Caim é representado como agricultor e Abel como pastor. São assim tipos das duas espécies de povos que existiram desde as origens da presente humanidade, ou pelo menos, desde que se produziu nela uma primeira diferenciação: os sedentários, ligados à cultura da terra, os nóma­das, à criação de gado. Estas são, é preciso insistir, as ocupações essenciais e primordiais destes dois tipos humanos; o resto é acidental, derivado ou acrescen­ tado, e fa lar de povos caçadores ou pescadores, por exemplo, como fazem co­ mummente os etnólogos modernos, ou é tomar o acidental pelo essencial, ou refe­rir unicamente casos mais ou menos tardios de anomalia e de degenerescência, como se pode encontrar realmente em certos povos selvagens (e os povos essen­cialmente comerciantes ou industriais do Ocidente moderno não são, aliás, menos anormais, embora de outro modo) Cada uma destas duas categorias tinha na­ turalmente a sua lei tradicional própria, diferente da outra, e adaptada ao seu género de vida e à natureza das suas ocupações; esta diferença manifestava-se nomeadamente nos ritos sacrificiais, e daí a menção especial que é feita das oferen­das vegetais de Caim e das oferendas animais de Abel, no texto do Génesis. Já que fazemos aqui uma referência particular ao simbolismo bíblico, é bom notar já, a este propósito, que a Thora hebraica se liga propriamente ao tipo da lei dos povos nómadas: daí a maneira como é apresentada a história de Caim e de Abel, que, do ponto de vista dos povos sedentários, apareceria sob outra luz e seria susceptível de outra interpretação; mas, claro, os aspectos correspondentes a estes dois pontos de vista estão incluíd os um e outro no seu sentido profundo, e não são, na realidade, mais do que uma aplicação do duplo sentido dos símbolos, apli­cação à qual só fizemos uma alusão parcial a propósito da «solidificação», já que esta questão, como se verá melhor a seguir, está estreitamente ligada ao sim­ bolismo do assassínio de Abel por Caim. Do carácter especial da tradição he­braica vem também a reprovação que se faz a certas artes ou a certos ofícios que estão ligados propriamente aos sedentários, e nomeadamente a tudo o que diz respeito à construção de habitações fixas; pelo menos foi assim até à época em que precisamente Israel deixou de ser nómada, durante alguns séculos, isto é, até ao tempo de David e de Salomão, e sabe-se que, para construir o Templo de Jerusalém, foi preciso chamar operários estrangeiros.

São naturalmente os povos agricultores que, pelo facto de serem sedentários, acabam, mais tarde ou mais cedo, por construir cidades; e, de facto, diz-se que a primeira cidade foi fundada pelo próprio Caim; esta fundação só teve lugar, aliás, muito depois de se terem referido as suas ocupações agrícolas, o que mostra bem que há como que duas fases sucessivas no «sedentarismo», em que a segunda representa, em relação à primeira, um grau mais acentuado de fixação e de «concentração» espacial. De modo geral, as obras dos povos sedentários são, por assim dizer, obras do tempo; fixados no espaço e num domínio estritamente delimitado, desenvolvem a sua actividade numa continuidade temporal que lhes aparece como indefinida. Pelo contrário, os povos nómadas e pastores não edificam nada que perdure, e não trabalham com vista a um futuro que lhes escapa; mas vão adiante de si próprios no espaço, que não lhes opõe nenhuma limitação, mas, pelo contrá­ rio, lhes abre constantemente novas possibilidades. Encontra-se assim a correspon­ dência dos princípios cósmicos aos quais se liga, numa outra ordem, o simbo­lismo de Caim e de Abel: o princípio da compressão, representado pelo tempo e o princípio da expansão, pelo espaço. A bem dizer, ambos estes princípios se manifestam simultaneamente no tempo e no espaço, como em todas as coisas, e é necessário anotar isto para evitar identificações ou assimilações demasiado «simplificadas», bem como para resolver por vezes certas oposições aparentes; mass não é menos certo que a acção do primeiro predomina na condição temporal, e a do segundo na condição espacial. Ora o tempo gasta o espaço, se assim se pode dizer, afirmando desse modo o seu papel de «devorador»; igualmente, ao longo dos tempos, os sedentários absorvem pouco a pouco os nómadas: é esse, como dizíamos mais atrás, o sentido social e histórico do assassínio de Abel por Caim.

A actividade dos nómadas exerce-se especialmente no reino animal, móvel como eles; a dos sedentários, pelo contrário, tem como objecto directo os dois reinos fixos, o vegetal e o mineral Por outro lado, pela força das coisas, os se­ dentários chegam a constituir símbolos visuais, imagens feitas de diversas substân­cias, mas que, do ponto de vista do significado essencial, se reduzem sempre mais ou menos directamente ao esquematismo geométrico, origem e base de todas as fo rmações espaciais. Os nómadas, pelo contrário, para quem as imagens estão proibidas como tudo o que tenda a fixá-los num determinado lugar, têm símbolos sonoros, os únicos compatíveis com o seu estado de contínua migração. Mas há uma coisa notável que é o facto de, entre as faculdades sensíveis, a vista estar em ligação directa com o espaço, e o ouvido, com o tempo: os elementos do sím­ bolo visual exprimem-se em simultaneidade, os do símbolo sonoro, em sucessão; opera-se, pois, nesta ordem uma espécie de inversão das relações que vimos atrás, inversão que é, aliás, necessária para estabelecer um certo equilíbrio entre os dois princípios contrários de que falámos, e para manter as suas acções respectivas nos limites compatíveis com a existência humana normal. Assim, os sedentários criam as artes plásticas (arquitectura, escultura, pintura), isto é, as artes das fo rmas que se desenvolvem no espaço; os nómadas criam as artes fo néticas (música, poesia), isto é, as artes das fo rmas que se desenvolvem no tempo; porque, digamo-lo de novo, qualquer arte é, na sua origem, simbólica e ritual, e só por uma degeneres­ cência ulterior, muito recente, aliás, é que perde esse carácter sagrado para se tor­ nar finalmente o «jogo» puramente profano, ao qual está reduzida entre os nossos contemporâneos.

Eis onde se manifesta o complementarismo das condições de existência: os que trabalham para o tempo estão estabilizados no espaço; os que erram no espaço, modificam-se sem cessar com o tempo. E vejamos onde aparece a antinomia do «sentido inverso»: aqueles que vivem segundo o tempo, elemento mudável e des­truidor, fixam-se e conservam-se; aqueles que vivem segundo o espaço, elemento fixo e permanente, dispersam-se e mudam-se sem cessar. É preciso que seja assim para que a existência de uns e de outros se torne possível, pelo equilíbrio, pelo menos relativo, que se estabelece entre os termos representativos das duas tendên­ cias contrárias; se só uma ou outra destas duas tendências compressiva e expan­ siva estivesse em acção, o fim viria rapidamente, quer por «cristalização», quer por «volatilização», se nos é permitido empregar a este respeito as expressões sim­bólicas que devem evocar a «coagulação» e a «solução» alquímicas, e que corres­pondem, aliás, efectivamente, no mundo actual, a duas fa ses de que ainda iremos dilucidar mais à frente o respectivo significado. Com efeito, é este um domínio onde se afirmam com particular nitidez todas as consequências das dualidades cósmicas, imagens ou reflexos mais ou menos longínquos da primeira dualidade, a mesma da essência e da substância, do Céu e da Terra, de Purusha e de Prakriti, que gera e rege toda a manifestação.

Mas voltando ao simbolismo bíblico, o sacrifício animal é fatal a Abel, e a oferenda vegetal de Caim não é aceite; aquele que é abençoado, morre, aquele que vive é amaldiçoado. Rompe-se o equilíbrio, de uma parte e de outra; como restabelecê-lo senão através de trocas, de tal modo que cada uma tenha a sua parte das produções da outra? É assim que o movimento associa o tempo e o espaço, e de certo modo, é a resultante da sua combinação e concilia neles as duas tendências opostas de que falámos atrás; o movimento não é em si próprio mais do que uma série de desequilíbrios, mas a soma destes constitui o equilíbrio relativo compatível com a lei da manifestação ou do «devir», isto é, com a própria existência contingente. Qualquer troca entre os seres submetidos às condições temporal e espacial é um movimento, em suma, ou antes, um con­ junto de dois movimentos inversos e recíprocos, que se harmonizam e se compen­ sam um ao outro; aqui, o equilíbrio realiza-se, pois, directamente pelo facto mesmo desta compensação. O movimento alternativo das trocas pode, aliás, exercer-se nos três domínios espiritual (ou intelectual puro), psíquico e corporal, em correspondência com os «três mundos»: troca dos princípios, dos símbolos e das oferendas, tal é, na verdadeira história tradicional da humanidade terrestre, a tripla base sobre a qual assenta o mistério dos pactos, das alianças e das bên­çãos, isto é, no fundo, a própria repartição das «influências espirituais» em acção no nosso mundo; mas não podemos insistir mais nestas últimas considerações, que se ligam evidentemente a um estado normal do qual estamos muito af a stados sob todos os aspectos, e dos quais o mundo moderno não é mais do que negação pura e simples 









terça-feira, 10 de janeiro de 2023

Partido ou Ordem?

 

(Julius Evola - 2 de janeiro de 1940) 

Li recentemente algumas considerações interessantes sobre o conceito de ‘partido’, que, a nosso ver, merecem ser notadas e discutidas por sua importância. Isso é especialmente verdadeiro agora, quando as emendas introduzidas pelo Grande Conselho à constituição do Partido Fascista demonstram que eles estão longe de querer se apoiar no status quo e, em vez disso, há uma necessidade viva de revisar a ordem existente e tornar cada vez mais coerente em relação ao espírito do qual surgiu. De fato, Roberto Farinacci tem enfatizado que essas emendas, “ainda que à primeira vista pareçam um recuo, na verdade são uma expansão e um fortalecimento”. A pedra angular de toda organização é estabelecida pelo princípio da maior centralização espiritual e da maior descentralização administrativa. Este mesmo princípio é o espírito animador por trás da recente reforma. Por meio dele, o Partido Fascista vai se ajustando de forma mais coerente com sua missão, ‘que é ser o animador e a energia disciplinadora de tudo e de todos’. Para isso, é preciso que essa energia não se dissipe e quase submerja na vasta rede de inúmeras organizações, mas se concentre em si mesma, pronta e capaz de qualquer ação’.

Hoje há, portanto, uma reconfirmação da cura que acentua aqueles aspectos do partido por meio dos quais eles constituem um tipo de alma - falando como um aristotélico, poderíamos dizer, um tipo de enteléquia, o vital formador e animador princípio — para o novo estado. Que outros desenvolvimentos são teoricamente concebíveis nessa direção?

O primeiro aspecto que queremos tratar prende-se com uma questão que, superficialmente considerada, pode parecer apenas uma questão de nomes. Estamos lidando com a designação de 'partido', um termo que se originou no mundo da democracia parlamentar e se tornou absolutamente autocontraditório onde há um único partido que assumiu a autoridade do estado e declarou todos os outros partidos ilegais. É curioso que, nos dezoito anos do novo regime, ninguém jamais tenha pensado em propor a substituição desta palavra por um termo original e mais adequado à realidade. Uma designação diferente atenderia mais eficazmente às funções e ao significado efetivo do Partido Fascista: a de Ordem. Para esta designação não nos referimos às comunidades de tipo propriamente religioso ou monástico, mas sobretudo às antigas organizações cavalheirescas. A ideia de Ordem corresponderá então à de uma elite e a uma formação voluntária de traços 'ascéticos' e militantes, que defende essencialmente uma ideia preservadora de princípios e de uma tradição, e trabalha no apoio a uma determinada comunidade de pessoas, mais numerosas , mas menos qualificados, mais dedicados a interesses particulares e contingentes, e menos impregnados de um sentimento de elevada responsabilidade política e ética.

Na realidade, um nome como, por exemplo, Ordem Fascista do Império Italiano não seria inferior em dignidade ao nome atual, 'Partido Nacional Fascista', e como símbolo, mito ou força-ideia, a substituição seria vantajosa . Com o novo nome, a velha ordem de ideias de governo de partido demo-liberal seria definitivamente excluída como até mesmo o eco de um nome, e seria uma manifestação da mesma tendência que levou logicamente à recente supressão do nomes 'parlamento' e 'deputado'.

Essa ‘liturgia do poder’, que desempenha um papel nada desprezível em toda ordem política autoritária e tradicional, receberia um avanço preciso e significativo ao passar de Partido para Ordem.

O novo nome sempre lembraria a tarefa de defender o Partido de toda burocratização e contra o retorno de elementos burgueses, sempre enfatizando o lado “sagrado” do compromisso que assume. Isso serviria para dar um papel mediador ao seu juramento para que seus membros não tivessem outra alternativa além da fidelidade ou traição em relação aos princípios de seu próprio foro interno, que seria superior, ao invés de responder a qualquer externo autoridade ou controle. Se há um poder oculto em cada palavra, como na visão antiga, não temos dúvidas de que a designação de 'ordem' seria a mais adequada para evocar as forças necessárias para a mais alta vocação revolucionária e para uma abolição definitiva da chamada concepção 'moderna' do Estado; isto é, o estado como uma entidade racionalista, mecânica e agnóstica, como o “estado de direito” ou o “estado policial” ou o “estado econômico” das ideologias anteriores.

Se analisarmos os processos que mais contribuíram para a crise da sociedade e da civilização modernas, encontramos em primeiro lugar a separação da autoridade espiritual do poder temporal, ou elemento político. Essa separação foi seguida por uma inversão real. Ao extrair sua mais alta significação e legitimidade real da referência a uma realidade espiritual, o elemento político se posicionou como ultima ratio e tentou subordinar a autoridade espiritual a si mesmo, enquanto não oferecia nada além de ' motivos realistas de utilidade ou oportunismo como base para suas pretensões certas e novas - no máximo uma vontade bruta de poder. Precisamos estar muito conscientes de que é impossível falar seriamente de um renascimento ou reconstrução antes de restaurar os valores hierárquicos que pertencem a toda ordem normal e tradicional. Essa vocação está contida nas mais altas potencialidades da revolução fascista. O ponto de partida da nova ideia política fascista não é nem um princípio jurídico abstrato nem uma realidade material, mas sim uma nova visão de mundo repleta de significados espirituais.

Logo após visão de mundo, surge o ideal de um dado tipo humano, o ideal do 'homem de Mussolini' entendido nestes termos para que possa ser a base e o ponto de referência para a formação de um novo tipo de 'raça do espírito', com características próprias semblante preciso e 'estilo'. Em terceiro lugar vem o Fascismo como vida e atualização concreta da referida consideração geral e ideal humano em uma organização precisa, que nestes termos, na lógica de um processo restaurador assim concebido, terá menos os traços do 'Partido' do que aqueles de uma Ordem. No Partido como Ordem Fascista do Império Italiano encarnar-se-á a nova ideia espiritualmente revolucionária, consumar-se-á a evocação das forças mais profundas da raça, conservar-se-á e transmitir-se-á uma 'tradição', e haverá o de? realização nitiva do tipo de uma organização viril e implacável. Esta organização será formada menos por 'homens de partido' e simples 'carteirinhas' partidárias, aderentes a um determinado programa político por razões de oportunismo e utilidade, mas por espíritos unidos numa vocação única com traços espirituais, mais sagrado do que profano, e por uma vida rigidamente inspirada por princípios éticos e motivações mais do que individuais.

Este nos parece ser o contexto de um radicalismo revolucionário fascista, de uma transformação política completa, de um alinhamento coerente e definitivo de forças e valores segundo os quais a Itália de Mussolini está e sempre poderá estar à frente de todos os movimentos possíveis de reconstrução no Ocidente.


O Pai do Nacionalismo no Brasil

 

O pai do nacionalismo no Brasil foi Floriano Peixoto. Alguns sujeitos mais céticos perguntarão: por quê?

Respondo: Porque ele foi a inspiração inicial de todos os movimentos posteriores a ele e o que mais deixou um legado concreto que influenciou toda a história do país posteriormente, diferentemente de outras figuras anteriores a ele.

Getúlio Vargas, Plínio Salgado, Carlos Prestes — sim, ele era nacionalista — foram todos influenciados por Floriano em menor ou maior grau.

Floriano Peixoto criou o sentimento inicial nas massas da classe média e baixa de se mobilizarem politicamente em prol do país, algo inédito então na história do Brasil, mesmo que figuras nacionalistas ou patriotas tenham outrora existido.

Seu jacobinismo criou o germe do tenentismo, alimentado pelos positivistas e pelas escolas militares que não se sentiam representadas pela 'República Paulista'.

E foram justamente seus feitos heroicos que despertaram a admiração do trio que iria tumultuar os anos de 1930: Vargas, Plínio Salgado e Carlos Prestes.

Vargas cresceu em uma família castilhista que tinha quadros enormes do marechal em sua casa e cultivava os valores da guerra, com o próprio pai de Vargas tendo lutado pelos "Pica-paus"[1]. Já na escola militar, Vargas brigava pelos seus amigos para comemorar o aniversário do caudilho[2]. E, no ápice da revolução de 30, seu pai cita o marechal em carta, mostrando que Vargas não tinha se esquecido de seu ideal de governo. Já no seu governo, levantou estátuas, nomeou ruas e fez homenagens nas escolas militares e no D.I.P. para ele.[3]

Plínio Salgado tinha um pai que admirava o marechal e o sentimento que ele exalava, semeando o nacionalismo no seio do filho ainda jovem, que, mais velho, citava o alagoano em seus discursos: «A lição de Floriano Peixoto está viva e presente no coração dos integralistas [...] e ensinou aos brasileiros, pela voz do Marechal de Ferro, o segredo da honra dos povos e do prestígio das nacionalidades.” Tamanha inspiração e referência influenciaram o pensamento de Salgado, que chegou a sugerir, em seus escritos, a realização de atos de extremada violência, como os praticados pelo Marechal de Ferro, nas ações presidenciais do fim do século XIX: ‘A bala!’ Essas palavras de Floriano Peixoto nos ensinaram que os brasileiros, na defesa de sua honra, não devem temer e, muito menos, colocar os interesses de outras nações acima dos de sua Pátria. A lição de Floriano Peixoto é digna de ser imitada por todos nós. Sempre que alguém pretender ameaçar os brasileiros, nosso dever é repetir as palavras de Floriano, dizendo: 'receberemos à bala os invasores!'[4]

Já Carlos Prestes chamou Floriano e seus jacobinos de: «O grande movimento popular nacional»[5], além de atribuir ao marechal uma notória influência no movimento tenentista, chamando o movimento de 1922 de: "Os tenentes de Floriano".

Não irei me aprofundar aqui sobre as influências de Floriano após os '3 notáveis' da década de 30, mas podemos citar brevemente um personagem emblemático dos anos 50, o Marechal Lott, que o homenageou em seu aniversário: "Seduções, intrigas, entusiasmos frenéticos de amigos e partidários de nada valeram para desviar o ínclito chefe do ideal republicano e democrático. Era homem da legalidade. Julgaria trair o seu passado se usurpasse o direito inalienável previsto pela Constituição. É bem verdade que poderia reformá-la para justificar a sua continuidade no poder, mas, acima de qualquer motivo, estava uma límpida consciência de soldado e de cidadão".[6]

[1] Getúlio Vargas, Volume 1, Lira Neto.

[2] «Getúlio desde tenra idade fora "florianista" convicto.Getúlio que fora Sargento no exército, pediu baixa em solidariedade a amigos que foram expulsos por comemorarem a data de aniversário de Floriano mesmo ante uma proibição de um superior Liberal. Seu pai, Manoel Vargas, herói da Guerra do Paraguai, também fora condecorado por Floriano Peixoto, por servir espontaneamente o Batalhão Patriota na Guerra Federalista

contra os Liberais.» Getúlio Vargas, Volume 1, Lira Neto.

[3] "Na hora em que lançamos a pedra fundamental da Escola Militar, sob a recordação do dia em que morreu Floriano, mantenedor da ordem no Brasil e consolidador do regime implantado em 1889, eu vos afirmo evocando sua memória sagrada, que mantidas e preservadas a ordem e a tranquilidade públicas, estaremos, em breve, num largo período de prosperidade.". - Getúlio Vargas. Homenagem de Getúlio a Floriano Peixoto, quando da fundou a Escola Militar em 25 de junho de 1938, data de aniversário de morte de Floriano.

[4] Dos papéis de Plínio Salgado, Pág 31.

[5]https://atlas.fgv.br/verbetes /florianismo

[6] marechal Lott, a opção das esquerdas. Pág, 131

[7] http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-biografico/salgado-plinio

Livros recomendados: O Florianismo e a consolidação da República no Brasil; A diplomacia do marechal de ferro e Floriano Peixoto, Por que somos Florianistas?, de Lincoln Penna

Solitude - Mário Ferreira dos Santos

  O homem superior é um solitário. Na época atual do homem-massa, em que o gosto se generaliza num sentido de perspectiva comum, de anseios ...