Em primeiro lugar, não é verdade que López era um tirano quando as nações vizinhas se uniram para fazer guerra contra ele. Ele não era um arrivista nem um caudilho, um usurpador do poder: eleito presidente de forma legal em seu país, assumiu o governo pacificamente. Ele era um autocrata porque a Constituição Nacional dava ao presidente um poder e uma responsabilidade indispensáveis para o bom desempenho do cargo supremo. Mas esse autocrata não abusou do amplo poder que lhe foi concedido, pelo menos não no grau necessário para ser considerado um déspota. Não há menção de um único ato de tirania durante esse período que pudesse justificar uma revolta, muito menos uma intervenção estrangeira. Se ele não foi melhor do que todos os presidentes que tivemos, certamente não foi pior do que eles, adotando os critérios que usamos para julgar quem são bons e maus presidentes.
Sua preocupação era grande em elevar o Paraguai no concerto das nações, procurando dotá-lo de todas as melhorias materiais então conhecidas. Os paraguaios se gabam de que seu país foi o primeiro a ter ferrovias e telégrafos no Rio da Prata. Do ponto de vista militar, López não poderia ter alcançado os patamares que a moral e a razão indicam aos estadistas modernos, ou seja, o pacifismo. Ele teve que abraçar os preconceitos que ainda hoje persistem entre os líderes do povo e que se traduzem no aumento, o mais amplo possível, dos armamentos. Diante dessa preocupação desumana, que infelizmente ainda hoje é considerada legítima, López fez o que considerava seu dever. Ele elevou seu exército a tal grau de eficiência que, isolado do mundo e, portanto, privado de recursos, foi capaz de resistir por cinco anos aos exércitos de três nações unidas, em comunicação aberta com toda a Terra. As tropas paraguaias eram admiráveis em disciplina, bravura e abnegação. E sua pequena frota, embora fluvial, era capaz de lutar batalhas com esquadrões inimigos. Canhões e carabinas já estavam sendo fabricados em seus arsenais.
Ele desenvolveu o comércio e a agricultura. Ele chamou a atenção do mundo para seu país por meio de legações que manteve em Londres, Paris e Roma. E — impróprio de um tirano! — ele protegeu as artes e as ciências: quando a guerra foi declarada, uma centena de jovens paraguaios estudavam engenharia, direito e medicina na Europa e nos Estados Unidos, às custas do Estado. Falando sobre o Paraguai naquela época, Juan Silvano Godoy diz: "Seus filhos eram fortes, dedicados ao trabalho, sóbrios, prudentes, respeitosos e corajosos. Suas mulheres eram trabalhadoras, abnegadas, bonitas e tinham amores castos. Os paraguaios viviam em abundância, contentes e felizes, sob o regime de um governo patriarcal, ciumento do crédito, da dignidade e da honra da nação."
Portanto, o Imperador Pedro II, quando liderou a guerra contra o Paraguai, não poderia ter como objetivo a libertação do Paraguai de um tirano, já que não havia tais tiranos lá naquela época. Mas, mesmo que essa guerra tenha sido empreendida em nome da civilização, as resoluções do tratado de aliança, que não trata delas, não se conciliam com essas intenções generosas. O que mais o preocupava era a compensação, as presas que seriam compartilhadas, os territórios a serem conquistados e os limites que seriam impostos aos derrotados. Como tais disposições civilizariam um país e o libertariam de seu tirano?
Mas admitamos que López era um tirano. Suponhamos que eles estivessem certos ao proclamar esse propósito: quem foi que pediu ao Brasil o serviço de libertar o Paraguai de seu tirano? Se, hoje, nas pátrias brasileiras, unidas pelos laços da federação, e onde alguns déspotas se entregam a excessos reprováveis, consideramos ilegítima (e com razão) a intervenção do poder central, mesmo quando envolve a ação de quem se diz oprimido, como justificar a intervenção estrangeira numa nação independente que nada pediu? Suponhamos, porém, que houvesse todos os motivos para intervir: de um lado, um tirano que oprime; de outros, vítimas que clamam. Ainda assim, não foram a Argentina, o Uruguai e muito menos o Brasil que puderam decentemente apresentar-se como cavaleiros andantes; os dois primeiros, porque ainda eram vítimas de líderes que mantinham seus países em constante opressão e desordem; e o Brasil, porque manteve a escravidão. Na verdade, admitindo a cavalheira internacional, a intervenção de López no Brasil seria muito mais justificada para nos livrar de Pedro II, que mantinha uma raça escravizada. E isto é tirania inegável!
Mas a maneira como os aliados libertaram o Paraguai de seu suposto tirano foi infernalmente singular. Eles devastaram o campo, saquearam e destruíram as cidades, exterminaram a população, que ficou reduzida a 140.000 homens e 180.000 mulheres, impuseram um imposto de guerra tão grande que já hoje equivale a uma quantia muitas vezes maior do que aquela que a Alemanha impôs à França em 1870; ignoraram todas as propostas de paz e ocuparam militarmente o território por mais de seis anos. Em resumo, eles libertaram a nação de seu tirano, exercendo a tirania em sua forma mais perfeita.
Enquanto isso, examinando as coisas mais de perto, percebe-se que aconteceu exatamente o oposto: o que os aliados fizeram foi dar ao Paraguai um tirano. López era um presidente moderado antes da guerra e tornou-se sanguinário durante o curso da campanha. Se considerarmos que a essência de uma luta, especialmente cruel como esta, só pode ser uma excitação contínua de instintos egoístas, é lógico concluir que foi a guerra que a transformou assim. "Nem o primeiro nem o segundo ano da luta estão manchados de horrores", diz o autor de quem extraímos esses dados; "mas o duelo interminável, sua desigualdade, a vontade fria e irredutível de aniquilar por parte dos aliados, o juramento de vencer ou morrer, a certeza de não poder vencer, apesar de todo o heroísmo, acendem a fúria, excitam diariamente, rompem as restrições humanas e terminam por precipitar no abismo da loucura assassina o inteligente e culto governante da véspera." Por tudo isso, não é correto afirmar que os aliados libertaram o Paraguai de um tirano; a verdade é exatamente o oposto.
Há, contudo, duas circunstâncias que não devem ser esquecidas quando se deseja fazer uma avaliação desta tirania. Uma delas é que López comandou uma das defesas mais difíceis; um país pequeno, privado de recursos, isolado do mundo, contra três nações muito mais fortes e cujo suprimento de materiais e homens era ilimitado. Não é impossível encontrar nas necessidades impostas por essa defesa extremamente difícil, não diremos uma justificativa completa, mas valiosos atenuantes para seu absurdo. A segunda circunstância é que a Tríplice Aliança não estava em posição moral de estigmatizar os crimes dos outros. Quando queremos falar de atrocidades, é nosso primeiro dever levar em conta as nossas, para evitar que se repitam. "A intensidade do anátema deve ser reduzida quando chega a hora de evocar as aberrações da Tríplice Aliança? Os massacres vingáveis que foram sua lei ignorados? A crônica da campanha das Cordilheiras oferece aspectos terríveis. Fogo de hospitais inimigos, profanações de todo tipo, ninguém recebe quartel. As ignomínias daquele período são propriedade exclusiva das tropas imperiais, que as acabaram com a carnificina das Sete Colinas, onde, como já nos lembramos, mais de duzentos rendidos foram abatidos. Em Aquidabã, o marechal e seus bravos companheiros foram mortos como bestas. Mas o aspecto sombrio não se limitava às fileiras imperiais. A carnificina era a regra geral. Relatando a segunda batalha de Itá Ivaté, o general Garmendia explica: 'Ocorreu então uma pequena escaramuça, na qual só havia homens feridos e outros que imploravam por misericórdia; essa desordem do vencedor foi horrível, e o Coronel Morales tentou a todo custo organizar a marcha desordenada; mas, por outro lado, ouvia-se o grito seco, como o grito de uma coruja, do Coronel Agüero, que gritava: 'Matem, matem!' Isto é o que diz um filho de uma das nações aliadas.
Em vista de tudo o que foi exposto, não é apropriado recorrermos a sofismas ridículos para justificar nossa conduta infeliz. Devemos bater no peito, confessando nosso arrependimento. Mas somos tão teimosos que, em vez daquela atitude humilde de pecadores contritos, ainda comemoramos nossas façanhas. Como nos expomos ao riso! Como dirão aqueles que conhecem o caso e sabem que, se houver glorificações que serão feitas, as maiores corresponderiam exatamente ao lutador que foi derrotado, López! Não só pelo que ele era como soldado (e ele não era menor que qualquer outro), mas também porque naquele conflito ele foi o único líder que lutou por uma causa incontestavelmente justa: a defesa de seu país, pela qual fez o supremo sacrifício.
Um ilustre brasileiro já reconhecia a grandeza da nação paraguaia naquele conflito: o Sr. Joaquim Nabuco. Em uma obra sobre a guerra, ele diz que os Aliados fizeram muito, sem dúvida; mas, tendo em conta os recursos de que dispunham, a sua determinação, tenacidade e sacrifícios, não foram nada comparados ao que fez o Paraguai, e acrescenta que só o esforço deste último pode ser qualificado de grande e sublime.
Abandonemos, portanto, nossa conduta ignóbil. Se há motivos para cerimônias, eles só podem ser de reparação. É horrível zombar dos derrotados. Somente uma celebração de fraternidade e paz com o Paraguai poderia nos tornar maiores. E assim serviríamos melhor à memória do valente General Osório, que disse que "seu maior desgosto era ver sua pátria em guerra e se encontrar em um campo de batalha; que seu dia mais feliz seria o dia em que recebesse a notícia de que o povo — pelo menos os civilizados — estava celebrando sua irmandade queimando seus arsenais." (Fernando Osorio: História do General Osorio, página XXVI). Não insistamos em ser inferiores à nobre nação uruguaia que, há trinta anos, devolveu os troféus e cancelou a dívida.
Médico General Bagueira Leal
Rio de Janeiro, 7 de junho de 1916
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